Regina Medeiros
Disse-vos, não há muito, meus caros filhos, que a caridade, sem a fé, não basta para manter entre os homens uma ordem social capaz de torná-los felizes. Pudera ter dito que a caridade é impossível sem a fé. Na verdade, impulsos generosos se vos depararão, mesmo entre os que nenhuma religião tem; porém, essa caridade austera, que só com abnegação se pratica, com um constante sacrifício de todo interesse egoístico, somente a fé pode inspirá-la, porquanto só ela dá se possa carregar com coragem e perseverança a cruz da vida terrena. Um Espírito protetor. (Cracóvia, 1861.) – (O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. XI, item 13).
Fé atitude própria de convicção ou crença, que relaciona o homem a Deus na expectativa da salvação da alma; é um sentimento inato no homem; uma centelha basta para desenvolvê-la. Acreditamos que seja cumulativa, pois, uma vez adquirida, tende a ser progressiva, numa mesma encarnação; por outro lado, existem pessoas que, desde a mais tenra infância, têm o sentimento inato da fé, demonstrando que a exercitaram anteriormente, enquanto, em outras, ela é quase ausente; não podemos transmiti-la aos outros, mas podemos racionalizá-la, para que possa ser aceita pelo outro de uma forma objetiva, sensata e baseada em informações que possam ser provadas pela ciência.
As virtudes morais são potências racionais que inclinam o homem para o bem, quer como indivíduo, quer como espécie, quer pessoalmente, quer coletivamente. Temos duas espécies de virtudes: adquiridas e infusas. Entre as virtudes infusas, estão a fé, a esperança e a caridade, que são consideradas teologais, por serem dons de Deus para seus filhos. Estão latentes no ser humano e fazem parte da sua natureza, esperando, apenas, “o toque divino” para germinar; este “toque divino” acontece com todos, em alguma época de nossa vida imortal, representando fases mais avançadas evolutivas, quando o germe da intelectualidade, já propicia o encontro da nossa alma com o divino, permitindo o despertar da fé; é um momento sublime e marcante, que Jung e a psicologia transpessoal referem como “encontro com o numinoso”. A partir desse instante especial, a fé continuará a se desenvolver progressiva e cumulativamente. Inicialmente, ela será sediada na crença do maravilhoso e do sobrenatural. Com o desenvolvimento intelectual, sobrevirá a necessidade de explica-la, aceitando os fatos maravilhosos, na medida em que repousarem sobre explicações científicas. Esta é a fé propiciada pela Doutrina Espírita: a fé raciocinada.
A Fé cega, não examinando nada, aceita sem controle o falso como o verdadeiro e se choca, a cada passo, contra a evidência e a razão; levada ao excesso produz o fanatismo. A fé raciocinada, que se apoia sobre os fatos e a lógica, não deixa atrás de si nenhuma obscuridade; por isso, nos afirma Kardec que “não há Fé inabalável senão aquela que pode encarar a razão face a face, em todas as épocas da humanidade”. (Kardec, 1984, ESE, cap. XIX, item 6).
A fé em Deus nos leva, automaticamente, ao encontro do aprendizado do amor; passamos a compreender pouco a pouco, a nossa destinação espiritual e a nossa responsabilidade sobre este destino; descobrimos que o outro é nosso irmão e que estamos aqui para crescermos juntos, auxiliando-nos reciprocamente para progredir. E surge assim, a necessidade de servir e amparar aos retardatários ou sofredores do caminho; nasce, mais adiante, a compaixão, filha do amor latente que existe em todos os seres humanos. A compaixão e a piedade, por sua vez, darão origem à caridade, que é a representação objetiva do exercício pleno e lógico da fé raciocinada, associada ao germe do amor existente em todos os homens.
CARIDADE é, portanto, o AMOR EM AÇÃO. A partir daí, não pararemos mais de crescer, pois a prática do amor e do bem vão nos atrair cada vez mais para o seu exercício. Deus, em sua infinita sabedoria colaborou para que este fenômeno se repetisse, tornando o bem compulsivo em nós; colocou endorfinas em nosso metabolismo cerebral, que inundam o nosso corpo de bem estar, sempre que tem a sua liberação propiciada por variados mecanismos; e a prática do bem é um desses mecanismos acionadores da liberação de endorfinas na circulação sanguínea, promovendo sensação de bem estar, sempre que praticarmos o bem. E por que nos sentimos felizes, ao praticar a caridade, intuitivamente repetiremos esses exercícios de assistência ao próximo, recebendo novas gratificações interiores de satisfação, mantendo um círculo de “dar-receber” permanente em nossas vidas.
A prática constante ou rotineira da caridade será, então, responsável pela educação espiritual do ser humano, a um ponto de Kardec haver afirmado, que “fora da caridade, não há salvação”.
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